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Perspectivas do Feminino e Feminismo. O momento de resgatar a integridade pessoal. |
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8 de Março. Em meio ao burburinho e movimento de um local público comecei a escrever este texto. Não podia deixar de fazê-lo. É dia de colher as flores plantadas, no ativismo, na caminhada de transformação e em reflexões e avaliações sobre a situação das mulheres na sociedade e cultura. Agnes Heller, historiadora e filósofa húngara anunciou que a revolução feminina é a maior revolução da história que conhecemos, porque traz em seu bojo a maior mudança de paradigmas. Ainda que essas mudanças se construam diariamente e as percepções demorem a entender o significado do processo, podemos refletir sobre o ano que passou e verificar a quantidade de denúncias das mulheres de abusos, violências à mulher no âmbito das religiões e em várias atividades inimagináveis, como artísticas, desportistas e outras mais. E como as religiosas de conventos resolveram romper o silêncio e denunciar em público os abusos que sofreram do próprio clero. Essas denúncias nos deixaram a pergunta: O que ocorreu, por que resolveram romper o silêncio e a "submissão" ? Em foco o poder patriarcal e até misógino de muitas religiões e religiosos. A espiritualidade ganhou novos contornos, novo status e questionamentos relacionados ao feminino e às mulheres. E sem podermos observar concretamente, mas sentir a própria terra, que como entidade biológico-espiritual e natureza emanou energias novas e forças para a etapa em que se pode reconhecer a busca da integridade e transparência nessas relações. A caída de máscaras. Ocorrências coletivas que comportam também a transformação em nível individual, em novo momento de ajuste de contas e de consciência. Ainda que não percebido a olhos nus, o feminino está em tudo e está emergindo para as consciências cantando a marcha de carnaval: "Ô abre alas que eu quero passar". E isso mexe com as estruturas rígidas, petrificadas, tanto em nível coletivo, como individual. Há um desdobramento do feminino no coletivo, realizando coisas inauditas e por isso também há reação, há resistência e as violências recrudesceram. Estar atentas a isso, assim como entrar no foco da necessidade de autoconhecimento, de crescimento tem suscitado nas mulheres a busca da integridade pessoal em vários níveis. Daí a quantidade de denúncias, de nós desatados, para que esse movimento possa fluir e ir adiante. Muitas mulheres ao longo da História e de seus dias decidiram fazer "vista grossa" e aceitar ser cidadã de segunda categoria, não ser tratada como pessoa e acatar abuso de toda ordem a si e ás outras mulheres, como algo "normal". E daí se entende a cumplicidade que existe de mulheres com a ordem patriarcal, e até a perseguição ás mulheres que se prezam e lutam pela transformação do patriarcalismo e de si mesmas. Foram soterrados alguns instintos naturais e profundos necessários à mulher e ao feminino. Outros não foram desenvolvidos. Sob o signo da cultura patriarcal a natureza também foi esquecida, deixada à margem ou sob controle. O afã de controlar a natureza e com ela parte do feminino tornou a sociedade mais violenta, mais repressiva, mais tirânica, mais hierárquica, mais vertical, mais intolerante. Com isso sofrem e perdem todos, mulheres e homens. O advento do feminino para a sociedade e cultura significa, assim, a substituição de controle por harmonia, a verticalidade e hierarquia por horizontalidade e hierarquia entrelaçada, e o surgimento da alteridade como questão fundamental na relação de opostos. Se percebermos bem, a espiritualidade patriarcal busca subsumir o feminino ao uno, enquanto na nova cultura e novo paradigma que despontam procura-se a vivência dos opostos e suas qualidades insubstituíveis e complementares, em que o feminino reencontre o seu lugar. Vivemos, portanto, ciclos em que as mulheres buscam sua integridade em todos os níveis e reconhecimento de suas diferenças. E nisso há pluralidade. O feminismo, portanto, deixou sua direção dos primeiros momentos nos anos 70 e 80 do século passado, em que o descondicionamento da mulher pregado e estudado, significava ir em direção ao masculino, nas atividades profissionais, na vida social e outras e se regatar como pessoa produtiva, dentro e parte do sistema, deixando a esfera do lar. A tônica do sentido das mudanças agora é "SER". Isso envolve um processo de autoconhecimento, de transformação, de crescimento e de descondicionamento mais profundos, além dos papéis sociais. Buscar a singularidade e se entender em novas formas de estar e ser na coletividade. A mulher pode ser o que quiser ser, contanto que se encontre e possa compreender o seu entorno e a sociedade em que vive. As tarefas das mulheres nas mudanças neste século são importantes e, no entanto, são pesadas e exigentes, pois de sua própria transformação é que surgirá outro tipo de sociedade e cultura. Elas levarão a chama e o estandarte em seu reposicionamento e isso tem um preço, que já pode ser observado. As mudanças estão sendo movidas no nível dos arquétipos e não à toa as religiões têm sido um foco de denúncias e questionamentos, porque aí, nesse nível, estão os fundamentos, as petrificações, as rigidezes que impedem às mulheres o acesso à todas suas qualidades femininas e profundas, vez que as religiões patriarcais as isolaram do mundo da natureza e de suas forças e qualidades instintivas e intuitivas, consideradas por essas religiões forças do mal. Mas essa integração é necessária às mulheres, tanto em nível individual, quanto no coletivo. A vivência de religiões que afastam as mulheres de suas fontes originais e necessárias fazem com que adoeçam física, psicológica, emocional e espiritualmente. E isso é reproduzido em nível familiar, sistêmico e arquetípico. Daí que a espiritualidade necessita ser realizada em todos os sentidos. Todos vivemos momentos de passagem e tudo isso tem que ser considerado. O reposicionamento da mulher e do feminino, reposicionará o masculino na sociedade e cultura. Em relação às questões da integridade pessoal, a Lei Maria da Penha significou no Brasil, e isso repercute no planeta como um todo, uma nova orientação no debate sobre a integridade feminina, que mesmo não conseguindo debelar toda a violência, a desmascara, a considera crime e mostra que as mulheres não podem ser tratadas com violência. E que podem e devem denunciar. Essa aceitação pública dos enunciados e do que está subjacente á Lei fez da militância das mulheres e sua situação na sociedade e cultura dar um salto em relação ás questões da integridade pessoal e de ser sujeitos e respeitáveis como pessoas e cidadãs. Nesse sentido temos atualmente desdobramentos e reflexões que ajudam a aprofundar o tema. Esse movimento não pára. Há poucos dias vi um caso denunciado em redes sociais de violência sexual e física de uma mãe e filha, durante oito anos, por um psicopata que era marido e padrasto das mulheres. Essa situação terrível, em que a enteada do criminoso tentou denunciá-lo, mas não conseguiu nenhum resultado na policia e na justiça, tornou a vida dessas mulheres pior e mostra como há uma situação de vulnerabilidade, escamoteamento e cumplicidade das pessoas, que poderiam ter ajudado essas mulheres e que as deixaram sós nas mãos desse psicopata. Sabemos hoje e está sendo ventilado, ainda que muitos profissionais de saúde não queiram tocar o tema, que psicopatas têm uma forma de atuar que dificulta a reação das vítimas e que chamam de cárcere mental. Mas por outro lado, mostra como as mulheres ficam sozinhas, fragilizadas e com seus instintos de defesa abalados nessas circunstâncias. Mostra, então, a necessidade das mulheres constituírem redes de apoio às mulheres que passarem por essas violências de psicopatas, mas também patriarcais, porque necessitam de ajuda psicológica e apoio. As mulheres ficam muito sozinhas e em geral são desacreditadas quando sofrem violências. Quase ninguém acredita nelas e muitas vezes, ninguém acredita que em uma família considerada "de bem" sempre tem um ou mais "ogros" e que até mulheres façam esse papel terrível de violência e abuso patriarcal, quando não são cúmplices, por conveniências sociais. Essas questões são muito importantes de se reter, para trabalhar a integridade pessoal e pensar formas concretas de apoio às mulheres que contrarreste esse aumento da violência. É necessário entender esses ganchos de dependência emocional e psicológica de mulheres que aceitam a violência, o abuso e se pensar em formas de devolver saúde às mulheres vitimadas. De resto, necessitamos entender que aquilo que se fizer pelas mulheres e pelo feminino servirá às relações, à sociedade e à cultura como um todo.
Verônica Maria Mapurunga de Miranda |
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Dia 08.03.2019 |
março /2019 |
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