Já não quero saber de reflexos, nem de espelhos. Ali onde tudo parece igual ou único busco mais a inspiração.


  O RESGATE DO FEMININO IV OU  O SOL NÍGER¹,

 

ARQUIVOS

O FOGO CRIATIVO

Continuando minhas reflexões sobre os processos de transformação  e a importância do resgate do feminino tanto em nível coletivo, quanto individual, lembrei-me de algo que digo quando alguém sugere que eu sou uma pessoa disciplinada. Esta talvez seja uma palavra muito usada para indicar organização e persistência nos trabalhos e atividades, mas que também pode pressupor o velho chavão ordem e progresso, com tudo o que isso carrega e que não me agrada. Digo sempre brincando: sou disciplinada, mas também sou louca. Obviamente que não estou falando de "loucura patológica", mas de loucura criativa. Estou falando de imaginação "a louca da casa".

Mas na sociedade e cultura em que vivemos sair de determinados parâmetros maniqueístas e dualistas, ou isso ou aquilo, e admitir o Kaos criativo é perigoso. Lidar com o Kaos é difícil. Mas, se conseguirmos imaginar que o cosmos carrega esse Kaos e que esse Kaos tem uma ordem, um eixo em torno do qual todas as diferenças podem existir e coexistir, funcionando assim, podemos pensar nossas vidas tão terrenas e concebê-las também de uma outra forma. Concebê-las também dentro de uma ordem cósmica.

Esse eixo  é nosso próprio sol, usado de forma tão simbólica. Até aí pouca novidade. A maior novidade talvez seja que esse sol não é necessariamente masculino. Costumamos sempre pensar que o sol é uma propriedade masculina e que a lua é feminina, buscando os princípios de atividade e passividade. Mas além da lua a mulher carrega também no fundo de suas entranhas o seu eixo cósmico e que é o próprio sol feminino, apontado por Jung e outros pensadores como o Sol Niger, ou o sol negro¹. Continuadores das idéias do século das luzes saímos sempre à busca de claridade, o que eu denomino de "ansiedade da luz", mas aquilo que aparentemente não tem luz pode brilhar como um diamante negro.

Essas propriedades diamantinas são a intuição profunda, o fogo criativo, que é uma forma de conhecimento profundo e negado em nossa cultura. As características ligadas à intuição profunda, à imaginação, ao poder criativo que advém de forças instintuais e sublimes foram relegadas ao terreno do desconhecido  e do pouco confiável nas sociedades das luzes, científico-tecnológicas em que a objetividade não é mais o conhecimento de verdades profundas, mas parte de um pensamento analítico e fragmentado. Não há nada mais objetivo do que a imaginação verdadeira. Ela é carregada de lucidez e de compreensão ampla que tem por base a reflexão e a experiência vividas de forma simultânea.

Vivenciar esse fogo criativo significa cosmonascer, ou seja, criar ou atingir o seu próprio eixo, mergulhar no seu próprio cosmo. Nada muito fácil nos dias atuais já que esse feminino profundo, relegado ao esquecimento ou às sombras da cultura, depende de um longo caminho para ser despertado  e para as mulheres e a cultura se apropriarem novamente desse conhecimento, atingindo um novo patamar. O feminino profundo é um novo eixo que no meio das turbulências da crise atual da cultura e das vidas de todo mundo está emergindo. Com esse feminino estão emergindo novos paradigmas, nova forma de conhecimento e de vida. Talvez tenhamos que vivenciá-lo em meio a destruições e a turbulências, uma vez que não há aceitação dessas mudanças. Mas esse movimento não pára.

E é isso que precisamos entender. Reencontrar  ou encontrar seu eixo é descobrir o permanente movimento, ou a consciência e vivência dele. Entrar em processo de transformação é ir se dando conta desse permanente movimento. E a inércia é um dos maiores obstáculos para isso. Nos movimentos de transformação estamos em permanente jogo de confrontos com nossos limites e possibilidades. Os limites em qualquer área têm que ser reconhecidos, e buscada sua verdade última, para poder se ampliar as fronteiras das mil possibilidades. Aceitar um limite não significa parar e cruzar os braços. Significa cercá-lo de compreensão e de busca da verdade  e de transparência para se ampliar a visão e continuar o movimento.

Bloquear o movimento estanca as possibilidades de fluir e de expansão. Nesses processos vamos aprendendo que ninguém transforma ninguém, cada pessoa se transforma. A verdadeira transformação só ocorre ao se adquirir consciência e responsabilidade pelo processo, tornando-se capaz de compreender e assimilar o sentido que o percorre. E a consciência também de que a transformação é algo que não pára. A vida está em permanente transformação, só que na maioria das vezes não nos damos conta disso.

Alguém que constrói o seu próprio eixo ou o adquire, adquire também uma orientação interior. Sua forma de viver e atuar parte principalmente dessa força cêntrica e inteligente, ainda que muitas vezes não pareça. Diferentemente do que algumas pessoas colocam sobre a possibilidade de se construir uma nova família sélfica (esse sélfica é invenção minha, não copie por favor rss... rss.) com quem se pode trocar e vivenciar essa nova forma de ser, digo que a possibilidade de troca com qualquer pessoa e criatura em níveis diferentes, já mostra a ampliação da capacidade de viver a alteridade e autonomia. Existe a compreensão profunda e vivência da interdependência. Como cantam os tribalistas: eu não sou de ninguém, eu sou de todo mundo e todo mundo é meu também. Pode se aprender e compor com todas aquelas pessoas que for possível, sem necessidade de guru de qualquer tipo querendo lhe induzir e lhe manipular. Estes são logo transformados em arquivo morto.

Ninguém pode se adonar ou tentar subjugar alguém que responde ao seu próprio centro criativo. A relação de alteridade é de interdependência, sem se subordinar, nem tentar subordinar alguém. O fogo criativo cria vínculos e rompe vínculos que não servem, que são daninhos.

O Sol Níger para a mulher em nossa cultura é essa nova forma de poder que está brotando das entranhas da terra. Uma nova forma de conhecimento e de vivência para a cultura.

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¹ - O que estou denominando aqui de sol níger, ou sol negro, não se relaciona a nenhuma seita e muito menos ao nazi-facismo que fez, ao que parece, muito uso dessas expressões. Estou colocando sol negro como algo que ainda está oculto em nossa cultura, não veio à luz, por não ter podido ainda se constituir em um novo eixo de conhecimento juntamente com o sol masculino, e que corresponde ao feminino profundo. Se alguém se incomodar com a expressão sol negro que é muito estigmatizada pode colori-la à vontade. Eu não me incomodo nem um pouco.

§ O Resgate do Feminino III ou  Deixar Ir -

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§ O Resgate do Feminino ou Todo Dia é Dia -09.03.2008
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§ A Parte de Cada Um -15.11.2007
§Flores chamadas Beijos - Para Mortos e  Vivos, em uma cosmovisão diferente -02.11.2007
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Verônica Maria Mapurunga de Miranda

 

 

 

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agosto de 2008

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