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Foto da Beira-Mar -Fortaleza -Ce,  por Verônica Maria Mapurunga de Miranda - Junho de 2007


 

OS ESPAÇOS DA CIDADE DE FORTALEZA

DO GRADUAL AVANÇO DO COMÉRCIO SOBRE AS ÁREAS RESIDENCIAIS AO TURISMO SEXUAL VELADO EM CONDOMÍNIOS.

 

ARQUIVOS

Desde quando a cidade de Fortaleza ainda era uma pequena cidade ou quase uma vila iniciaram-se seus problemas como cidade. Como um retrato dos problemas sócio-econômicos do Estado do Ceará, quando ainda era uma província, ao longo do século XIX, a cidade começou a se rodear de pessoas flageladas das secas, vindas de toda a área sertaneja que compõe a maior parte do território do Ceará. Bairros como Parangaba, antigamente chamado Porangaba, foram formados com grande parte dessa população que imigrou em grandes levas de gente.

As áreas centrais da cidade que compunham as áreas residenciais, com um comércio ainda pequeno, viveu no final do século XIX uma verdadeira febre de cuidados, assepsias e saneamentos. Cercamento das áreas residenciais tradicionais, praças e passeios públicos, atemorizados pelas doenças, como a varíola, que se transformavam em epidemias nos grandes amontoados de pessoas e famílias imigrantes sem condições de vida, emprego e condições sanitárias adequadas.

 Além disso, os velhos problemas de diferenças de classe social, quando a jeunesse dorée não queria se misturar com a grande quantidade de imigrantes, novos formadores da população, e separavam as áreas em que eles poderiam circular nas praças e passeios. Essa preocupação com o saneamento  e disciplinamento dos espaços das cidades ocorreu em várias partes do Brasil, como mostram vários estudos históricos sobre as cidades.

Porém, uma característica central desse processo em Fortaleza foi o gradual aumento do comércio e o não estabelecimento adequado de áreas residenciais. Sem disciplinamento do espaço e preservação das áreas residenciais verificou-se um processo permanente de avanço do comércio sobre essas áreas. As residências foram aos poucos saindo do centro da cidade para parte da orla marítima Beira-mar, Bairro de Fátima, Gentilândia, Benfica, Parquelândia, etc. e depois, Aldeota, Dionísio Torres, Meireles e tantos outros. Mas o comércio, sem nenhuma forma de controle foi saindo atrás e as pessoas em busca de lugar calmo e sossego foram formando outros espaços, bairros como Papicu, Seis bocas e outros, enquanto o comércio continuava invadindo os espaços.

Aos poucos, pela violência e os problemas próprios trazidos pelo comércio as pessoas foram se instalando em prédios de apartamento, como o lugar residencial mais seguro, e em tese mais tranqüilo, deixando as casas que se transformaram em lojas, clínicas médicas e outros postos comerciais. A descaracterização da história da cidade por essas constantes mudanças de espaço e da perda da identidade cultural é sentida por todos aqueles que nasceram e viveram a maior parte de suas vidas em Fortaleza. Onde estão os espaços em que você pode sentir Fortaleza, já que a cidade por esses constantes avanços do comércio foi e continua sendo tão descaracterizada?

Além de ter uma população formada por tantas pessoas que vieram do interior do Estado, e provavelmente por lá deixaram suas raízes há ausência de amor pela cidade e há violência e revolta explícita na forma como a cidade é tratada em suas praças e em seus equipamentos. Apesar das praças sempre estarem sendo reformadas são permanentes alvos de violência: bancos e telefones quebrados, lixeiras destruídas, lâmpadas cercadas e com cadeados para não roubarem e quebrarem, e tantos outros sinais de desamor, ou  revolta. Tudo isso se instala como a dizer: Fortaleza, você não me trata e nem me recebe bem. Qual o meu lugar aqui? De fato, eu não te amo.

Com muitas outras complexidades já estudadas e por estudar, esse descompasso em uma cultura que, como diz um conhecido meu, ainda é rural por não haver ainda a "urbanidade" necessária a uma cidade e confundirem-se espaço público com privado, torna o espaço da cidadania mais reduzido. Isso significa dizer que o espaço dos direitos tem que ser sempre conquistado a duras penas.

Trabalhar no dia-a-dia os problemas da cidade, discuti-los e resolvê-los naquilo que afeta os cidadãos ainda é difícil, pela reduzida constituição do espaço público que é sempre avassalado pelo privado. Em outras palavras, cada pessoa quer utilizar o que é público, e  de todos, para si da forma que lhe aprouver. Junto com isso a cultura do "comercial usurário", que vai deixando de lado os valores em função do aumento do seu numerário. A consciência do social ou a responsabilidade social fica sempre relegada a segundo plano. Nesse tipo de sociedade e espaço público não há interesse real pelo social e os outros, grassa o individualismo.

As mazelas próprias dos avanços das atividades comerciais sobre as áreas  residenciais em Fortaleza tenderam a piorar com o estabelecimento mais efetivo do turismo. É digno de nota o aumento dos negócios imobiliários relacionados ao turismo, com os aluguéis por temporada, o grande afluxo de estrangeiros na orla marítima e as conseqüências  que vêm com as dificuldades para a regulamentação adequada das atividades turísticas. Sem entrar no mérito do turismo no que concerne ao lucro dos empresários à renda do Estado e ao emprego, ele traz alguns problemas sérios que vêm sendo discutido e denunciados por cidadãos, movimentos sociais, políticos, governo e prefeitura. Dentre eles o turismo sexual.

Um dos problemas sérios é o comércio sexual velado que está invadindo os condomínios residenciais trazendo insegurança aos moradores. São algumas mulheres que alugam apartamentos por temporada e fazem parte de redes de prostituição, criando pontos de apoio para outras comerciantes do sexo da orla marítima. Mais uma vez o comércio invade a área das residências, nos prédios e condomínios residenciais. Mas, um comércio muito mais perigoso, porque junto com ele vem tudo o que se relaciona com prostituição:drogas,violência,roubos e ultimamente assassinatos a turistas.

Sabe-se, e está sendo discutido em vários âmbitos, que o turismo sexual é feito em rede e dela não participam somente as prostitutas e garotas de programa. Dela participam donos de restaurantes, hotéis, taxistas e é de se supor que imobiliárias do ramo do turismo também. O mais sério é a forma sub-reptícia como ele está se instalando em condomínios residenciais, com a conivência de imobiliárias e proprietários  que querem aumentar o lucro dos seus aluguéis, sem se importarem com os danos que isso causa aos demais, inclusive à crianças e adolescentes que moram nesses condomínios.

Esses agentes são verdadeiros inimigos públicos, porque contribuem com redes de prostituição que trazem violência e narcotráfico, além da descaracterização dos espaços residenciais, trazendo insegurança para a população aí residente.

A dificuldade de enfrentar essa questão é devida às próprias leis do país que não regulamentam de forma adequada punições para esse tipo de comércio sexual, que causa dano e insegurança  às famílias de prédios residenciais. Em não sendo considerado crime, o comércio sexual não é regulamentado nesses casos em que ele invade áreas residenciais, apesar de trazer uma grande perturbação e insegurança para as pessoas.

Se as pessoas vão à ambientes de prostituição, elas sabem que é um ambiente perigoso e procuram se proteger. Mas se ela ocorrer em âmbito considerado familiar e residencial, de forma velada, em que só há indícios, as pessoas não estarão preparadas para se protegerem. Parte-se do pressuposto que diferentemente do ambiente reconhecido como de prostituição e mesmo a rua, onde você enfrenta risco de assaltos e outras violências, o recesso do lar em um condomínio com tipos de segurança variadas é um ambiente seguro.

Mas, infelizmente aqui em Fortaleza já não é assim. E esse problema tem se verificado inclusive em condomínios de luxo. É um  problema que tem que ser enfrentado e urge. Não há forma de um condomínio ou moradores de prédios residenciais expulsarem pessoas que alugaram um apartamento a uma imobiliária ou proprietário que não exigiram as referências adequadas a um prédio residencial, ou imobiliárias que alugam por temporadas para qualquer pessoa, sem muitas exigências. A única forma é a recorrência à polícia pela perturbação ao sossego. E nesse caso penaliza somente às comerciantes do sexo, criando situações extremamente constrangedoras e humilhantes. Nenhum condomínio residencial aceita chamar a polícia permanentemente para resolver problemas com moradores do seu prédio. Essa é uma solução ruim  e desagradável.

  Ao mesmo tempo, sabemos que não existe nenhuma forma de controle possível dessa situação, se não forem responsabilizados os locadores que alugam apartamentos para pessoas que tenham essas finalidades de comércio sexual. Seja imobiliária ou proprietários. Sabemos também que nos apartamentos alugados por temporada isso ocorre com maior freqüência e acaba sendo a forma preferida dessas redes atuarem, pela pouca exigência e dificuldade de controlar esses aluguéis por parte dos condomínios e moradores dos prédios. Donos de imobiliárias aliadas a essas redes de turismo sexual se valem para isso, das leis de condomínio em que não se pode proibir aluguéis por temporada. As convenções de condomínio  com esse tipo de regulamentação acabam se tornando inócuas por não poderem ser superiores às leis.

A situação é difícil para os demais moradores dos condomínios. Para os proprietários que terão a desvalorização do seu imóvel por causa dos pontos de comércio sexual que vão se tornando crônicos nos prédios. E para outros locadores de apartamentos, muitas vezes com uma locação em que cumprem muitas exigências e aluguéis caros, e que mesmo assim não têm tranqüilidade e são praticamente expulsos do lugar, porque o ambiente é muito inseguro e acabam tendo que se mudar do condomínio.

Nesse caso o ambiente da cidadania, da segurança, sossego e tranqüilidade está sendo obstaculizado por falta de uma melhor regulamentação e ação públicas sobre esse assunto.O que acontecerá com as áreas residenciais da orla marítima de Fortaleza que estão sendo todas tomadas pelo turismo sexual? Esse tipo de turismo e comércio sexual é muito difícil de ser detectado e combatido pela polícia e daí a preferência dessas redes de turismo sexual por condomínios residenciais. Em alguns casos em que os síndicos não têm interesse em solucionar ou denunciar o problema é pior para os demais moradores dos condomínios.

É necessário, portanto, que se crie uma regulamentação e também uma ouvidoria pública sobre estes problemas, para que cada cidadão ou cidadã Fortalezense e de cidades litorâneas possa denunciar, e apenas com indícios e testemunhas possam ser incriminados e responsabilizados os proprietários e locadores de apartamentos para comércio sexual explícito ou encobertos em condomínios residenciais. Essa é uma forma de desbaratar as redes de turismo sexual que estão se fazendo de formas veladas e dar mais segurança à população.

Vamos evitar que os cidadãos e famílias cearenses sejam expulsos dos bairros da orla marítima em Fortaleza, que ainda é um ponto de referência da cidade, para dar lugar à prostituição, narcotráfico e violência. Vamos desenvolver um pouco o nosso amor pela cidade e lutar pela regulamentação das áreas residenciais.

 

 §AS VELAS DO MUCURIPE - 10.07.2007

 
 
 
 
 
 
 


     
Verônica Maria Mapurunga de Miranda  

Dia Comum (28) 

Março de 2008

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