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*** Cronicando***

 

Para os olhos lembrarem quando o coração esquecer...

Uma frase comum de folhetim ? Uma lembrança perdida no tempo? Um pedaço de uma canção ouvida, de passagem, em um bar qualquer? Para os olhos lembrarem, quando o coração esquecer... pode ser tudo isso, mas em mim é uma lembrança antiga e bem concreta. Um fato real, mesmo que alguém tenha dificuldade em acreditar.Quando pré-adolescente, nos meus verdes anos de curiosidade romântica, a mim muito interessavam as cartas de amor. Sem internet, sem telefone nas cidades interioranas, as cartas cumpriam importante função entre namorados, pessoas que queriam se aproximar e não o faziam por timidez, pela distância. Amigos distantes trocavam idéias e cartões postais com maior freqüência. O correio escolar era imprescindível.

As cartas cumpriam um papel misterioso, mágico, que continham segredos, resolviam casos, consolidavam noivados e destruíam casamentos. Às vezes, também, feitas de forma anônima, as cartas prestavam-se para acusações e maledicências. Não raramente, em forma de pasquins, os moradores de pequenas cidades, recebiam cartas anônimas, com a crítica hipócrita e covarde, principalmente em momentos de ebulição política.

Como dizia o hit dos anos 70, o Carteiro: quando o carteiro chegou e meu nome gritou com a carta na mão/ ante surpresa tão rude não sei como pude chegar ao portão/ Num envelope bonito o seu sobrescrito eu reconheci/ a mesma caligrafia que disse-me um dia estou farta de ti... O carteiro e as cartas consagraram-se e  mesclaram-se, através dos tempos, com os mais variados e ambíguos sentimentos, emoções e casos. Até aqueles em que o profundo apego a situações passadas fazia com que as pessoas guardassem antigas cartas de amor. E foi esse um dos fatos que me ocorreu na pré- adolescência, e que me marcou.

Chegando um dia com uma colega na casa de uma parente, que havia casado há pouco tempo, ela nos chamou à parte. Queria que nós víssemos algo que ela achava interessante. Abriu a gaveta de um armário, que estava cheia de cartas. E disse: "São cartas das ex-namoradas de meu marido. Ele não quis se desfazer delas". Ele era viajante e tinha ex-namoradas em todos os lugares por onde passava.

 Eram cartas com fotos, papéis coloridos, algumas rescendendo ainda ao perfume com o qual foram enviadas. Cheias de todos os clichês românticos e de quem treina para fazer cartas, desde as mal traçadas linhas às frases mais clássicas. Uma delas, entretanto, me chamou a atenção. Tinha uma foto de mulher, na praia, de maiô e em pose de Miss. A foto em preto e branco, já ficando amarelecida pelo tempo, tinha a marca borrada de batom de um beijo, e atrás a inscrição: Para os olhos lembrarem quando o coração esquecer...      


Nos anos 80 adquiri um vinil de João Bosco. E qual não foi minha surpresa ao ouvir a composição dele e do Aldir Blanc chamada Miss Suéter na qual falam de uma miss e de uma foto em que estava a frase: para os olhos lembrarem quando o teu coração infiel esquecer. Fiquei pensando no tamanho da distância entre Rio, Minas e a cidade dos meus verdes anos. Uma frase dessas para ter corrido o país assim, é porque é contagiosa. Pega a gente pelos olhos ...e pelo coração.

Verônica Maria Mapurunga de Miranda - Novembro/1999

Aqui você me encontrará sempre com o cotidiano, com o prosaico, com o divertidamente humano, com o essencial que está presente em nossos encontros e desencontros do dia-a-dia. Aqui você me encontrará cronicando.


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