TRANSITANDO EM NOVOS PARADIGMAS

7-A INDIVIDUAÇÃO: UM PROCESSO DE LUTA E INTEGRAÇÃO. 2ª Parte  (VEJA ARQUIVOS)

Como relatei antes, este enfoque sobre individuação trata mais de processos  de transformação que Jung denominou de naturais. Que ocorrem na metanóia. Nesses artigos trataremos mais da compreensão do que seja o processo em si independente da relação com terapeutas, ainda que muitos casos analisados por Jung e junguianos tenham sido acompanhados. Não obstante, o seu próprio processo teve características de um processo natural e que se estendeu por longos anos e até o fim ele ainda retirava lições e compreensões do seu processo.

Uma das questões que acho importante situar é de que não existe individuação com script. Em geral vemos análises tentando colocar ordem nos processos, verificando as diferenças entre homens e mulheres e uma porção de outras variáveis, talvez buscando entender mais o processo, mas de fato o processo é único e variável. Alguém disse: Primeiro eu trabalho o animus/anima para depois eu ir para o inconsciente coletivo e coisas do tipo. Não funciona assim. Cada processo é um processo e aquilo ou motivo ou causa, que faz a pessoa ir para a individuação também é diferente. Algumas pessoas tiveram experiências transpessoais antes da individuação e nesse caso já existe uma relação com o inconsciente coletivo. O próprio Self é uma realidade além do inconsciente pessoal. São conhecidas hoje as emergências psico-espirituais, estudadas na psicologia transpessoal, outros tiveram um contato com o Self através de alguma experiência de pico, enteógenos e outros ainda tiveram sintomas ou doenças psicossomáticas, depressões no início e por isso o processo, mesmo que trabalhe e processe  os vários aspectos da psique, citados por Jung, são feitos de formas diferentes, em tempos diferentes e com ferramentas diferentes para viver o processo.

No processo natural de individuação quem comanda é o Self ou mestre interior, que já promoveu a "ferida no ego", segundo as próprias palavras de Marie Louise Von Franz e que objetiva em último caso retirar a pessoa de uma direção retilínea, linear, para uma direção circular da consciência. Como diz: "O verdadeiro processo de individuação —isto é, a harmonização do consciente com o nosso próprio centro interior (o núcleo psíquico ) ou self — em geral começa infligindo uma lesão à personalidade, acompanhada do conseqüente sofrimento. Este choque inicial é uma espécie de ''apelo", apesar de nem sempre ser reconhecido como tal. Ao contrário, o ego sente-se tolhido nas suas vontades ou desejos e geralmente projeta esta frustração sobre qualquer objeto exterior. Isto é, o ego passa a acusar Deus, ou a situação econômica, ou o chefe, ou o cônjuge como responsáveis por esta frustração. Algumas vezes tudo parece bem externamente, mas no íntimo a pessoa está sofrendo de um tédio mortal que torna tudo vazio e sem sentido." (M. - L. von Franz -O processo de Individuação in Carl G. Jung et alli - O Homem e seus Símbolos - Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 6ª edição, pag.166) .

 E isso significa que o ego passa a girar em torno do Self, como o seu próprio sol e eixo, estabelecendo com ele um diálogo. O objetivo é regular a psique e integrá-la em outro patamar, que é a constituição do si-mesmo. É um processo natural, o que significa também que enquanto processo de individuação não é uma patologia em si, mas cada pessoa pode ou  não portar alguma patologia. Em geral, quem entra em individuação é alguém capaz de suportar a tensão dos opostos, que vai existir ao longo do processo de integração e que exige equilíbrio.

A integração dos tipos (introvertido, extrovertido) e funções psicológicas (pensamento, sentimento, intuição, sensação ou percepção) é uma questão central, mas antes eu gostaria de falar da integração da SOMBRA, da PERSONA, e da relação ANIMA-ANIMUS que perpassam todo o processo em níveis que vão se aprofundando.

Uma das características da individuação e comparativamente com as fases dos processos alquímicos (nigredo, albedo, rubedo ) é a fase da nigredo, que corresponde ao  conhecimento da sombra. Para Jung a sombra é um vasto mundo do inconsciente, que como uma caixa de pandora tem os melhores remédios, mas também os piores venenos. E na alquimia há quem diga no processo que é necessário provar do veneno, para provar da cura. De fato, os processos à medida em que vão se desenrolando, vão também se aprofundando e as experiências seja da sombra, seja da retirada de máscaras e projeções, seja do reconhecimento e integração do animus/anima vão se tornando mais difíceis porque mais coletivas. Segundo Jung, em sua analogia com a alquimia e tendo por base o seu próprio processo, é possível vivenciar 3 fases alquímicas  a que poucos conseguiram completar, mas que provavelmente neste século muitos irão nessa direção. Vou colocar aqui de forma sucinta.

 A primeira é a unio mentalis (união mental) que significa tornar-se o "um interior" ou individuação, ter o conhecimento do si-mesmo,  que inclui o autoconhecimento que abranja as alturas e as profundezas do próprio caráter. É a separação do corpo e a união da alma e espírito, em que o indivíduo adquire segurança interior e autonomia.

A segunda etapa seria Unus Mundus que consiste em reunir a unio mentalis  com o corpo. Unir novamente a posição espiritual com o corpo, quer dizer "manifestamente" que o conhecimento adquirido tem que tornar-se real. (Um conhecimento pode tornar-se suspenso quando simplesmente não é aplicado). A união dos opostos nesse caso vai ocorrer com a quintessência.

O terceiro e último grau, Universal, seria  a relação do atman pessoal com o atman suprapessoal ou do tao individual com o tao universal, para citar a referência dada por Jung, porque seriam experiências existentes somente nessas tradições espirituais

Em geral as "individuações" ocorrem no primeiro grau e passam pelas fases nigredo, albedo e rubedo  e nesse miolo ou processo  costuma ocorrer a integração da sombra necessária a essa fase e a retirada das projeções, o reconhecimento da persona e a retirada das máscaras,  a transformação e integração do animus nas mulheres e da anima nos homens, ocorrendo a conjunção de primeiro grau (alma e espírito).

No segundo grau a questão se aprofunda porque entra em cena tudo o que é corpo e natureza de uma forma mais enfática. É um processo que vai do individual a dimensões cada vez mais coletivas e nesse sentido cada pessoa e cada vaso, vai configurando aquilo que é sua própria necessidade individual, mas também coletiva. E apontando nesse sentido o propósito de cada um, suas tarefas, suas realizações e nelas aparecerão também suas provas.

Muitas vezes vemos pessoas compararem os processos e dizerem, eu já passei dessa fase, quando na verdade nunca estiveram nela. Porque os vasos são diferentes, maiores e menores, a capacidade de cada um também, assim como as tarefas próprias. E por isso não pode haver comparação. Cada um com seu vaso, cada um com suas tarefas ou propósito, cada um com seu processo. Muitas vezes algum guru ou terapeuta ou  mestre quer encaixotar o processo de alguém porque leu em determinado livro ou porque o seu processo foi assim, mas nenhum processo e nenhuma experiência ou metodologia de livro pode responder às necessidades individuais e únicas. A individuação nos leva à unicidade. Por isso a individuação em grande parte é um processo solitário, em que se segue seu próprio mestre interior. E é através dele e das sincronicidades que vamos até às coisas, às pessoas e aos lugares em que precisamos aprender.

Nesse sentido o processo feminino é também diferenciado e já há mulheres começando a trabalhar e divulgar essas questões. E são as próprias mulheres que, transformando-se em caminhos nos seus próprios processos, podem trazer experiências importantes que comporão o leque das possibilidades de uma espiritualidade feminina resgatada e necessária aos tempos atuais. Algumas mulheres no resgate desse feminino e da natureza, para si e para as exigências da época, irão mais a fundo e sua estrela apontará para a quintessência.

Como disse, a etapa alquímica mais provável e mais comum de se realizar é a "unio mentalis", e, portanto, é sobre esse processo que em geral se trabalha psicologicamente falando. Nele há a primeira etapa de nigredo, albedo e rubedo e as integrações necessárias a uma personalidade total que coloca o indivíduo em outro patamar, transpessoal e integrado.

Verônica Maria Mapurunga de Miranda . 17.01.2020

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Obs: Informações e noções sobre os arquétipos que compõem a psique, os tipos psicológicos, os complexos, o inconsciente coletivo que são partes importantes do processo de individuação podem ser encontrados na bibliografia abaixo, além de explicações em vídeos na página do Facebook : Diálogos com Jung.

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Bibliografia sobre individuação:

1- Jung Carl Gustav - O homem e Seus Símbolos - Rio de Janeiro : Ed. Nova Fronteira. Edição Especial Brasileira .

2- Jung Carl Gustav - Aion - Estudos sobre o simbolismo do si-mesmo. Petrópolis, RJ: Vozes, 5ª edição, 1998.

3 - Jung Carl Gustav  -Tipos Psicológicos- OBRAS COMPLETAS DE C.G. JUNG VOLUME VI - Petrópolis. RJ: Vozes, 1991

4- Jung Carl Gustav - O Eu e o inconsciente- Petrópolis, RJ: Vozes, 1987

5- Jung , Carl Gustav - Psicologia e Alquimia- Petrópolis, RJ: Vozes, 1990.

6- Jung , Carl Gustav - Psicologia do Inconsciente - Petrópolis, Vozes, 1980

7- Jung, Carl Gustav - Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo - Petrópolis, RJ:Vozes, 2000.

8- Jung, Carl Gustav - Estudos Alquímicos - Petrópolis, RJ:Vozes, 2003

9- Marie Louise Von Franz - Psicoterapia - São Paulo, Paulus, Coleção Amor e Psique,3ª edição, 2011

10 - Maroni, Amnéris - Figuras da Imaginação - Buscando compreender a psique. São Paulo: Summus, 2001

 

 


Fotomontagem por Verônica Maria Mapurunga de Miranda

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